A parceria poderosa da Born X Raised que arrecadou quase R$1 milhão para defender imigrantes em L.A

Sabe o que é mais incrível na moda e na música quando elas deixam de ser só estética, pose e teoria? É quando essas duas coisas se encontram e viram um manifesto e um lembrete claro de que não pode haver silêncio mediante injustiças. E, também, de que você não precisa viver necessariamente gritando por algo; a sua presença pode ser silenciosa, mas, quando resolver gritar, lembre-se de ter peso e propósito.

Além disso, se você leu nossa matéria sobre a possível perda de uma geração de artistas que não têm medo de se posicionar, vai entender perfeitamente o peso dessa ação.

Entenda o clamor de uma comunidade ameaçada

Nos últimos anos, as políticas migratórias extremamente agressivas e ações de deportação têm gerado um clima de medo, incerteza e infelicidade entre os imigrantes em Los Angeles. A cidade, conhecida por sua diversidade, viu suas comunidades serem alvo de ataques brutos e sistemáticos. Diante desse cenário dolorosamente cruel, a necessidade de apoio legal e vozes unidas em prol daqueles que não podem falar e nem lutar, se tornou mais urgente do que nunca.

Acontece que em junho de 2025, o ICE (criado após o ataque às Torres Gêmeas e que faz parte do Departamento de Segurança Interna dos Estados Unidos, responsável por aplicar as leis federais à imigração alfândega, comércio e segurança nacional), conduziu uma série de operações de deportação em Los Angeles. As batidas ocorreram em bairros com grande concentração de imigrantes, igrejas, escolas, centros comunitários, etc.

Logicamente a comunidade foi rápida em reagir a essa situação, organizando marchas e manifestações em locais com MacArthur Park e Boyle Heights. Até mesmo porque, diversas pessoas relataram que seus familiares estavam desaparecendo, além de sofrerem com abordagens extremamente violentas e por vezes desnecessárias.

Com isso, protestos começaram a acontecer e rapidamente se intensificaram ao ponto de resultar em confrontos com as forças de segurança. Balas de borracha, gás lacrimogêneo e, em alguns casos, força física, foram algumas das formas usadas para conter os manifestantes que estavam, nada mais e nada menos, em busca de justiça (e antes que digam que os manifestantes estavam sendo violentos, é fato que às vezes só conseguimos isso com muita luta e barulho. Por que apenas o opressor pode ser violento?). Centenas de pessoas foram presas durante os protestos.

Mesmo com o apoio de organizações civis, celebridades e sindicatos, o presidente Donald Trump ordenou o envio de 4.700 membros da Guarda Nacional e 700 fuzileiros navais para LA. O governador da Califórnia, Gavin Newsom, contestou a decisão alegando que a medida infringia a soberania do estado.

Moda como manifesto e o impacto para a causa

A Born X Raised, marca de streetwear e com raízes profundas na cultura de Los Angeles, foi fundada em 2013 por Chris “Spanto” Printup (falecido em 2023) e Alex “2Tone” Erdmann. Neste ano de 2025, a marca uniu forças com Zack de La Rocha como modelo na divulgação (e aparição raríssima) das camisetas e moletons – edições limitadíssimas – com os dizeres: “Protect Los Angeles” e “Fight for those who cant” (em PT BR: “Proteja Los Angeles”; “Lute por aqueles que não podem”).

A ação, que arrecadou US$151.209,14 (R$816.664,68 na cotação atual), reverteu 100% do valor à ONG CHIRLA, organização que oferece serviços legais essenciais para imigrantes em situação de vulnerabilidade. A campanha que foi fotografada por Atiba Jefferson e contou com Ozzie Juarez (além de Paisaboys, IRAK, 424, Casino LA, Babylon, Nothing Personal, Fuerza Regida, Homerun, Fucking Awesome, Menace, Union, Awake NY, Tlaloc Studios e Undefeated), não vestiu apenas corpos: vestiu a luta contra um sistema fascista e opressor, defendendo trabalhadores, estudantes e famílias ameaçadas de deportação.

O senso de comunidade deve transcender fronteiras

Quando você veste, fala e apoia estas ações, está dizendo que as vozes de comunidades marginalizadas importam; que o direito dos imigrantes, dos jovens e dos povos originários importam e não podem ser apagados. Cada peça lembra sobre fortalecer comunidades, proteger os mais vulneráveis e mostrar que a resistência pode ser bonita e poderosa ao mesmo tempo.

Mas, dentro disso tudo, talvez o maior aprendizado que fica seja mais simples do que parece: você não precisa estar em todos os lugares, não precisa gritar o tempo todo para fazer diferença. Às vezes, basta aproveitar que sua imagem e história tem relevância, e estar presente quando importa; agir com intenção; colocar seu talento, voz e energia a serviço de quem mais precisa.

A campanha da Born X Raised com Zack de La Rocha e a ONG CHIRLA é exatamente isso: um lembrete de que ação “silenciosa”, mas carregada de propósito, pode mover montanhas. E que, no final, a luta por justiça e direitos humanos não é apenas de quem está na linha de frente, mas de todos que escolhem se posicionar: à sua maneira, no seu tempo, mas sempre com coragem e consciência.

Também, é válido mencionar que existe uma ironia amarga e gigantesca em toda essa história: os imigrantes, que carregam a cultura, a música e a força desta cidade, acabam sendo forçados a sair de um lugar que historicamente sempre foi deles. Los Angeles, que um dia pertenceu ao México, hoje os vê lutando para permanecer em uma terra que conhecem como própria, enquanto são tratados como estrangeiros em sua própria história. É nesse contraste que ações como a da Born X Raised ganha ainda mais sentido: resistir, sem dúvida alguma, sempre foi sobre a necessidade de existir.

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