Com o lançamento de seu novo álbum Man’s Best Friend, Sabrina Carpenter voltou a ser alvo de críticas nas redes sociais. O motivo? Suas músicas e conceitos que abordam a sexualidade do ponto de vista de uma mulher — ainda vistos como tabu.
Da Disney ao topo do pop
Apesar de já ter uma longa trajetória como atriz e cantora, Sabrina Carpenter se consolidou mundialmente no mainstream apenas nos últimos três anos. O álbum Emails I Can’t Send, que trouxe o hit “Nonsense”, foi o primeiro a projetar seu nome de forma global.
Em seguida, o sucesso de Short n’ Sweet ultrapassou todas as expectativas, impulsionado por faixas como “Expresso”, “Taste” e “Please Please Please”. O disco abriu caminho para uma turnê de mesmo nome, que viralizou nas redes com performances intensas e sensuais.
Performances, críticas e a estética de Man’s Best Friend
Durante a turnê, Sabrina chamou atenção com apresentações de músicas como “Juno” e “Bed Chem”, em que falava e encenava temas ligados ao sexo. Vídeos da cantora brincando com insinuações, posições e até performances em cima de uma cama com um dançarino circularam amplamente nas redes, gerando uma onda de reações negativas que só aumentou com o tempo.
As críticas também se estenderam ao figurino: roupas inspiradas em lingeries foram vistas por parte do público como “excessivas” e “vulgares”, apesar de fazerem parte da proposta artística do show.
O lançamento do álbum Man’s Best Friend reforçou esse debate. A capa, em que a cantora aparece de joelhos com um homem segurando seu cabelo, foi duramente criticada. No entanto, a imagem faz referência ao título, uma provocação ao ditado de que “o cachorro é o melhor amigo do homem”, sugerindo que a mulher, na visão machista, seria colocada ainda abaixo disso.

Nas letras, Sabrina também não recua: continua abordando temas de desejo, intimidade e relações de poder, reafirmando que falar de sexo não deveria ser um tabu, especialmente quando parte da perspectiva feminina.
Eu fico molhada só de pensar em você (aham)
I get wet at the thought of you (uh-huh)
Sendo um cara responsável (shiquitá)
Being a responsible guy (shikitah)
Me tratando como deveria (aham)
Treating me like you're supposed to do (uh-huh)
Lágrimas escorrem pelas minhas coxas
Tears run down my thighs
O tabu da sensualidade feminina
O incômodo com Sabrina Carpenter não é um caso isolado. Mulheres que falam abertamente sobre sexo ou se mostram seguras em relação à própria sensualidade continuam sendo julgadas de forma desproporcional.
Esse padrão se repete na indústria musical há décadas. Madonna, nos anos 80 e 90, foi chamada de “vulgar” por clipes e performances que exploravam a sexualidade feminina. Britney Spears, nos anos 2000, enfrentou escrutínio pesado da mídia por dançar e cantar sobre desejo ainda jovem. Hoje, um exemplo claro é Anitta, que até hoje é alvo de ataques por suas letras, coreografias e figurinos, muitas vezes taxada de “indecente” pela mídia e pelo público.
O contraste é claro: quando um homem canta sobre sexo, a narrativa gira em torno de confiança, virilidade e poder. Quando uma mulher faz o mesmo, a discussão quase sempre é sobre “excesso”, “decadência” ou “falta de talento”, como se sua obra fosse reduzida ao corpo e à aparência e como se elas usassem disso para atrair a fama.
No caso de Sabrina, o desconforto social pode se intensificar porque sua trajetória começou em produções da Disney. Para muitos, há uma dificuldade em aceitar que artistas que cresceram sob os holofotes infantis amadureçam e expressem abertamente sua sexualidade — algo que já aconteceu também com Miley Cyrus, Demi Lovato e Selena Gomez.

Duas medidas para a mesma atitude
A reação às performances de Sabrina Carpenter ganha ainda mais contraste quando comparada ao tratamento dado a artistas masculinos. Recentemente, um show de Chris Brown viralizou após ele simular atos sexuais com uma fã no palco. O episódio recebeu menos críticas do que as performances de Sabrina, revelando a desigualdade no julgamento social.
E ele não é o único exemplo. Cantores como The Weeknd, Usher e Justin Timberlake já incluíram gestos, letras explícitas e coreografias sensuais em suas apresentações, mas raramente enfrentam ondas de ataques do mesmo nível. Pelo contrário, muitos são elogiados como “ousados”, “carismáticos” ou “sedutores”.
A discrepância mostra como a sociedade ainda enxerga a sexualidade masculina como algo natural e até admirável, enquanto a feminina continua sendo vigiada, reprimida e julgada. O duplo padrão não afeta apenas a imagem pública das cantoras, mas também influencia o mercado: artistas mulheres muitas vezes precisam provar constantemente que têm “talento além da sensualidade”, enquanto artistas homens não enfrentam essa cobrança.
Esse cenário reforça que a arte também imita a vida. O caso de Sabrina Carpenter não é único — ele apenas ganha maior visibilidade por estar em evidência no pop internacional. No cotidiano, muitas mulheres ainda são julgadas ou silenciadas por expressar sua sensualidade e assumir sua sexualidade de forma segura.
Ao manter seu discurso e construir um conceito artístico que desafia o tabu da sexualidade feminina, Sabrina não só fortalece sua própria carreira, mas também influencia outras mulheres a perceberem que têm o direito de se expressar livremente. Sua permanência nos holofotes contribui para expor a hipocrisia da sociedade e ajuda a indústria musical e o público a enxergarem com mais clareza as desigualdades de gênero que precisam ser corrigidas.